Exposição Virtual
Mônica Dalcol - Minhas marés
Quero ser gente
Entra pela janela um cheiro de vida nova
O sol vem desfazer as bolhas d’água
Que escorre pelo vidro opaco
Como escorrem os sonhos dentro da gente
A fragilidade sempre bate à porta
Por vezes, dando pontapés
Há quem resista
Faz-se muro
Muralha
E guerra
Já não resisto mais
Ela invade a minha carne
Meus ossos
E faz meus dedos escreverem
É que agora ela quer ser minha amiga
Ela segura minha mão
Nós vamos juntas até a janela
Respiramos o cheiro do sol
Enxergamos a cor do ar
É que minha vida sempre foi entre as frestas
Vendo o que quase ninguém vê
Sentindo o que quase ninguém sente
Hoje eu fui derrotada
Há derrotas que valem a pena
Já não quero mais ser fortaleza
Só gente
Gente que é frágil.
(Mônica Saldanha Dalcol)
O retrato da mulher pendurado na parede
O quadro, quadrado, é lugar de simetria
Que não cabe vida alguma
Tampouco, a humanidade
O retrato é o ideal
O tempo certo
A figuração correta
O filtro que estanca a vida
As entranhas não cabem no retrato
Retrato é lugar de idealismo
Que não condiz com a realidade
Embora o velho Hegel quisesse
A vida não cabe no sistema
Nem no retrato
O retrato é objeto de veneração
Só se é possível venerar aquilo que foi aprisionado
É uma forma de estancar a fluidez das rugas
Dos dias
O retrato da mulher na parede
É como a personagem de Charlotte Gilman, em “ Papel de parede amarelo”
Sufocada
Passiva
Presa
Amortecida
Retiramos o retrato da mulher na parede
Por aqui, agora, só há espelhos
Que é para lembrar todo dia
Que não gostamos de idealismos
Nem de mulheres sufocadas em retratos
( Mônica Saldanha Dalcol)